segunda-feira, 23 de março de 2015

Vem pedalar Camila Mansour.


Depois das manifestações do dia 13 e 15, criou-se certa expectativa de qual seria a próxima grande manifestação. Há atos marcados para o dia 31 de março, 12 de abril, 1o. Maio...
Mas para surpresa geral, o próximo grande ato não será a favor ou contra determinado partido político ou dirigente, será um grande ato mundial em defesa das ciclovias de São Paulo (dia 27/03/15).
Vejam os locais em que já há confirmação (e não para de crescer):
Brasília entrou também com sua bicicletada e seu apoio!
https://www.facebook.com/events/1037454626284371/

Palermo - Itália em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/1411195765852113/

Guatemala!!!!!!!!
https://www.facebook.com/masacritica.guatemala/photos/a.344681505705762.1073741834.344272379080008/403881009785811/?type=1&theater

San Francisco - EUA - menção em apoio a São Paulo!
https://www.facebook.com/sfcriticalmass?fref=ts

Köln / Germany - Solidarity in support of São Paulo's Bike Lanes
https://www.facebook.com/critical.mass.koeln/photos/a.671759442856329.1073741836.518468108185464/936315223067415/?type=1

Maringá em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/438476956329897/

München - Germany - Solidarity in support of São Paulo's Bike Lanes
https://www.facebook.com/events/366790256837701/

Recife em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/1642032596016643/

Campo Grande em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/344676739054629/

Florianópolis em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/1570588189863381/

Natal em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/1592678867685123/

Fortaleza em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/1560615607560487/

Blumenau em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/1592919994284997/

Rio de Janeiro em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/394683364045391/

Belo Horizonte em apoio a SP!
https://www.facebook.com/events/892012437503518/


O Judiciário de nossa principal megalópole parece que, em determinados momentos, tem se confundido a respeito das próprias atribuições e tentado se fazer passar por poder Executivo. A pouco mais de uma ano, simplesmente barrou uma atualização dos valores do IPTU (que inclusive baixaria o IPTU em áreas mais pobres), medida a qual, discordemos ou não, é atribuição do ente federativo municipal.
Agora vem uma promotora e pede uma liminar para que seja barrada a ampliação de TODAS ciclovias da cidade e ainda pede para desfazer a da Avenida Paulista. Eis que em ato contínuo o Juiz acata parcialmente a liminar, apenas desconsiderando o pedido da Paulista.
Resumo da tragédia: Um prefeito eleito começa a cumprir seu programa de governo, o qual constava ampliação das ciclovias, e um poder não eleito pelo povo, diz que aquela política pública não é de interesse do povo.
Parece que ser contra tudo que venha do PT virou profissão de fé de várias pessoas pelo país, ainda que a medida beneficie a própria pessoa. Dizem até que um ou outro parou de andar de bicicleta por ser aquela política implementada pelo PT e apoiada por “ciclo-ativistas” chatos.
Mas preocupa mesmo é quando esse sentimento vem de agentes com considerável poder dentro das instituições. Achar que bicicleta é coisa de comunistas ou de “vermelhos” é mostrar que a mentalidade Tea Party fecundou nossas terras. O surrealismo destas paranóias tiveram seu auge com a ação do deputado estadual Joseph Jo Raymond Diwan (PSDB), o qual viu na cor vermelha uma propaganda subliminar do partido que governa. Mais um pouco e chegaremos às loucuras de alguns americanos anti-Obama que poluem o ambiente para pirraçar os “ecos-chatos” ( http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/07/eua-nova-moda-e-poluir-o-meio-ambiente-de-proposito/).
O curioso é que muitas dessas pessoas quando viajam para a Europa ou os EUA, sempre ficam deslumbradas com a “civilidade” dos mesmos, de usarem a bicicleta para transporte, de terem malha cicloviária, de desfrutarem de maior qualidade de vida, etc... Todos sabem que a bicicleta tem ganho espaço no mundo todo, principalmente nos adorados países desenvolvidos. Contudo, quando aqui chegam, tratam logo de refutarem a ideia, brandindo que somos incapazes, incompetentes e incivilizados para alcançarmos tal patamar de organização.
Tem horas que suspeito que mais do que uma síndrome de vira-lata, o sentimento inconsciente é de que caso também venhamos a nos desenvolver, desfaz-se o encanto das tão cultuadas viagens internacionais. Temos que ser avacalhados para continuarmos cultuando a santa majestade estrangeira...
Mas voltando ao papo da política conheço vários ciclistas que não costumam votar no PT e que votaram no Aécio Neves nesta últimas eleições, aliás, até arriscaria dizer que são maioria entre os ciclistas. Contudo, tirando aqueles que adotaram uma postura de guerra total, de que “tudo-que-venha-do-PT-é-ruim”, uma boa parte continua com a saudável postura sábia e responsável de avaliar as coisas separadamente. Um governante pode estar num partido que eu não gosto, mas efetivar algumas políticas com as quais eu concorde.
Parece que a intenção da medida tomada pela promotora Camila Mansour é amarrar o governo de Fernando Haddad, tentando lhe tirar o seu principal carro-chefe de gestão. Contudo, forneceu agora um elemento de união para os ciclistas não só de São Paulo, mas de todo o Brasil e deixou exposto o lado político do Judiciário.
Ou seja, assim como a maioria das pessoas não costuma gostar de discussões partidárias, acredito que irão rechaçar ainda mais essa politização escancarada do Judiciário. Gostem ou não do PT, o prefeito Fernando Haddad está apenas cumprindo um dos pontos de seu programa de governo. Por outro lado, a decisão judicial contra as ciclovias demonstra um viés partidário que não pode perpassar um poder que pretende "neutro".
Por último, para a Camila Mansour, recomendo o mesmo que para qualquer pessoa. A bicicleta não é só um bom meio de transporte a contribuir para o meio ambiente e diminuição do tráfego. Equivoca-se quem pensa que ciclistas são eco-chatos ou altruístas sacrificando-se em nome de um bem maior. Na verdade, o prazer de andar de bicicleta, de se exercitar, de liberar a endorfina, de encontrar com as pessoas e conhecer melhor a cidade, nada mais é do que um prazer egoísta. Os ciclistas estão procurando o próprio bem-estar, como bem pregam qualquer liberal que se preze. A diferença é que a bicicleta é um bem mais acessível e democrático.
Então, esqueçam os fantasmas do comunismo, não tenham medo e venham pedalar com a gente no dia 27. Aposto que a própria Camila Mansour mudaria de ideia após um prazeroso passeio.

#Ciclistasporsaopaulo

segunda-feira, 16 de março de 2015

Desvendando o discurso anti-corrupção - I (Dilema Hobbesiano)

Sempre meditei sobre os motivos que levam as pessoas a se sentirem atraídas por discursos/plataformas exclusivamente anti-corrupção. Alguns chegam ao nível da histeria, sentem-se verdadeiramente perturbados, ameaçados, envoltos num “mar de lama”. O suposto mundo imoral estaria ameaçando o seu mundo virtuoso e moral...




Nos últimos tempos, percebo que tal “bandeira” ganhou espaço em quantidade e intensidade. Parece que contra o PT, a “bandeira” anti-corrupção, contra mensalão, petrolão, etc... passou a ser a plataforma principal a unir mídia, políticos de oposição, classe média enraivecida e mesmo alguns setores mais pobres. O último ato do dia 15 mostrou a força do discurso e a capacidade de ser a liga firme para possíveis frustrações de outra ordem.

Mas enfim, o que torna tão atrativo esse tipo de discurso? O que o faz tão persistente ao longo dos anos e com considerável influência no ânimo das pessoas, nas suas emoções e intenções? Nos meus tempos de movimento estudantil escutava dentro da esquerda que aquilo era uma forma de despolitizar o debate, de flertar com o moralismo para “esconder” as estruturas de exploração. Nunca gostei muito de tal explicação, me parece insuficiente ainda que tenha alguma fundamentação. 

Na verdade, em geral é fácil perceber certa seletividade nas indignações vistas por aí, o que nos levaria a concluir que as pessoas são hipócritas e falsas. Mas com o tempo fui percebendo que um número considerável de pessoas não percebem essa seletividade, elas o fazem de maneira “honesta”. Indo mais além, fui percebendo que certas formas de pensar e construir julgamentos são quase que universais sejam à direita ou à esquerda, e estão todos sujeitos a erros bem corriqueiros. 

Assim, pretendo usar este espaço para desenvolver algumas ideias que tenho a respeito do tema. Nunca é demais ressaltar que é um texto teórico, tentando desvendar justificativas subjetivas e condicionantes sociais que propiciam a prática da corrupção ao mesmo tempo em que todos dizem rechaçá-la. 

Dilema Hobbesiano:

O dilema hobbesiano que desenvolvi aqui também ajuda a entender alguns desses mecanismos. Meu palpite é que as pessoas não o aplicam com inteira consciência, mas sim com certa intuição do seu funcionamento e nos momentos em que favoreça a si. 

Recuperando um trecho do Steven Pinker: 

“Se você tem razão para desconfiar que seu vizinho é propenso a eliminá-lo, por exemplo, matando-o, então você será propenso a se proteger eliminando-o primeiro, em um ataque preventivo. Você pode ser tentado a isso mesmo que normalmente não seja capaz de matar uma mosca, contanto que não esteja disposto a cruzar os braços e se deixar matar. A tragédia é que seu competidor tem todas as razões para fazer o mesmo cálculo, mesmo que ele seja incapaz de matar uma mosca.” (PINKER, 2013)

Enfim, o dilema diz de forma crua que se estamos todos em guerra uns contra os outros, qual o sentido de ser um homem honesto e virtuoso a seguir todos os maiores preceitos morais? Com certeza, o cidadão virtuoso será o primeiro a ser morto, ou na melhor das hipóteses, viverá uma vida miserável sustentado os desonestos, ladrões, assassinos, etc... Isso para um kantiano não tem nenhum problema, pois sua ética deontológica e seu imperativo categórico determinam a agir conforme preceitos morais universais, independente de haver alguma reciprocidade ou instituições que limitem certos comportamentos. 

Max Weber chamava esse tipo de escolha de ética da convicção, mas que em determinadas situações pode trazer consequências éticas também indesejáveis, como deixar uma mãe em um parto de risco morrer por não aceitar o aborto em hipótese alguma ou não mentir mesmo em situações de risco. Weber, portanto, reconhece que o ser humano em muitas situações lida com escolhas trágicas, seja por uma convicção colidir com uma consequência indesejada, seja pelos termos das escolhas serem igualmente trágicos.

Em certos termos, acredito que o ser humano dificilmente se dispõe a abraçar imperativos que o prejudiquem de maneira tão radical como dar cabo da própria vida ou abraçar a miséria absoluta. A ética da responsabilidade proposta por Weber reconhece os dilemas existentes, o possível desrespeito a convicções em determinadas situações e prima por essa ideia de responsabilidade do sujeito, de saber reconhecer as próprias escolhas e de que elas podem ser trágicas.

Um exemplo muito citado de escolha trágica é aquele em que o pai está com dois de seus filhos escondendo de soldados nazistas. Um dos filhos é recém nascido e começa a chorar, podendo acusar o local em que os três se escondem. Nessa situação, vale dar cabo da vida de um filho para salvar a si e o outro? Recentemente e em episódio da vida real, dizem que no tsunami da Indonésia, uma mãe teve que escolher qual de dois filhos ela salvava...Existem vários exemplos desse tipo.

Enfim, são situações extremas, às vezes bem retratadas em filmes e seriados. Na quarta temporada da série Walking Dead, uma moça (Carol) resolve matar dois companheiros do grupo para que uma doença não se espalhasse, a maioria ficou horrorizada, mas depois um dos mais indignados a perdoou... Mais chocante ainda é quando ela mata uma criança que ela mesma jurou proteger, devido ao fato de que a criança estava surtada, ameaçando a segurança do grupo por acreditar que zumbis eram iguais aos seres humanos. Enfim, no seriado aparecem interessantes retratos de situações hobbesianas, dilemas diversos, onde prevalece a guerra de todos contra todos, cada grupo querendo sobreviver, devendo atacar primeiro para garantir suprimentos e por ai vai.

Na literatura, não é outra a ideia transmitida pelo delicioso personagem Quincas Borba de Machado de Assis:

“— Não há morte. O encontro de duas expansões, ou a expansão de duas formas, pode determinar a supressão de uma delas, mas rigorosamente, não há morte, há vida, porque a supressão de uma é princípio universal e comum. Daí o caráter conservador e benéfico da guerra. Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas chegam apenas para alimentar uma das tribos, que assim adquire forças para transpor a montanha e irá à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz, nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se pelo motivo real de que o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas.”  (Quincas Borba, capítulo VI)

Assim em ambiente Hobbesianos é razoável imaginar que a guerra irá prosperar e desejos antes contidos irão aflorar...

Pois bem, acontece que no ambiente hobbesiano, todos são ao mesmo tempo cidadãos cheios de moral quando se autoavaliam, mas também ladrões, assassinos, vagabundos quando são os outros quem te olham... Você provavelmente terá um alto conceito moral de si mesmo, mas sabendo que está sob ameaça intensa, flexibilizará suas regras morais para sobreviver no ambiente hostil. Em qualquer guerra, aberta ou velada, percebe-se maior propensão para o ser humano liberar sua besta fera. 

E então chegamos finalmente ao tema da corrupção. Qual a diferença de ser assaltado por bandidos do PCC ou por bandidos bem vestidos? Aliás, quando o tráfico ou milícias estão mais bem organizadas, o roubo acontece de maneira menos violenta ou mais velada, tipo retaliando quem não paga o Vale Gás ou não compra a "proteção". A dinâmica de cobrança muitas vezes se parece com a tributação.

E se você considera que é assaltado por políticos vagabundos, desonestos, essa "corja" que suga tudo, e por ai vai... Qual o sentido de ser um homem virtuoso e moral para sustentar essa corja? Qual o sentido de pagar impostos e arcar com o sustento do Estado? 

Ao final, chega quase a ser uma obrigação moral se defender sonegando impostos, comprando recibos médicos, molhando a mão do policial, ou até mesmo desviando um recurso público. Afinal, em qualquer desses casos, se você não o fizer, esse dinheiro estará indo para um político Super-Hiper -Mega corrupto, enquanto você provavelmente considera que seus fins são mais legítimos, importantes, e, provavelmente, mais morais. Pergunta-se: Quem devolveria uma carteira cheia de dinheiro que encontrasse perdida e seu dono fosse o Paulo Maluf? 

A grande questão é que todos podem estar (e provavelmente estão) pensando exatamente como você. Até o maior dos vilões da atualidade, o político, teria seus motivos "legítimos" e racionais para se defender desviando um dinheiro, evitando que ele vá parar na mão de alguém ainda mais corrupto ou de um adversário com poder de aniquilá-lo. No campo econômico, monopólios, oligopólios e cartéis serão o caminho natural. Corporativismos de todo o tipo se formarão nas administrações públicas e nas classes profissionais (triste lembrança da resistência histérica dos de jalecos branco contra o Mais Médicos). Ao final, o burocrata também terá suas razões para desviar ou privilegiar a si e os seus e o mesmo pensarão os empresários. Não é a toa que estimaram a perda com sonegação no Brasil em R$ 500 bilhões, enquanto os corruptos desviariam 70 bilhões... Mas quem nunca ouviu que é legítimo sonegar porque o Estado é corrupto e/ou não oferece contrapartidas?

Assim sendo, os discursos contra a corrupção parecem que crescem em intensidade na mesma medida em que quem os professa se sente desculpado para cometer certos atos também corruptos. A corrupção verdadeiramente grave é sempre praticada pelos outros, enquanto cada um se perdoa. Todos juram serem seguidores da boa moral e dizem apenas que estão se defendendo. 

Por fim, em um quadro degradante é possível que os mais razoáveis percebam o engodo dos discursos moralistas e passem a atuar com mais "desfaçatez" ou "sensatez" a depender da ótica. A verdade é que o dilema hobbesiano nos deixa um mundo de guerra total, onde alguns conseguem ver essa realidade crua e atuam conforme suas regras (aos vencedores as batatas), enquanto outros agem brutalmente, mas glorificam e fazem loas à moralidade. (A propósito, seres imorais ou que pregam serem donos da moralidade tendem a ser dois extremos perigosos!)

Solução?!? Hobbes sugeriu o Leviatã, um poder acima de todos os outros a garantir a paz. Daí em diante, mais alguns milhares de laudas desenvolveram na Ciência Política ideias e práticas como formação de consensos, democracia, estado de bem estar social, políticas públicas, etc... os quais se não trouxeram a solução, pelo menos apresentaram um ambiente mais promissor do que o da Idade Média.

Já no âmbito individual, acredito que o caminho da realização humana só é possível com a superação desse dilema, pois mesmo os vencedores terão que arcar com desgastes psicológicos das guerras, com adrenalina alta, nervosismo, ódio, ansiedades e transtornos diversos, além de consequências não previstas, etc... Enfim, todo um caldo de sentimentos que embrutecem e desqualificam a vida, tornando impossível a felicidade.

Por fim, nos dias atuais, acredito que boa parte da sociedade não viva o dilema hobbesiano, muito pelo contrário. Existem países em guerras ou mesmo setores sociais sob extrema vulnerabilidade, mas não considero nem de perto que o dilema se imponha na sua forma crua e absoluta.* (Aliás, mesmo em momentos extremos o ser humano apresenta comportamentos surpreendentes e o altruísmo também compõe as emoções humanas, não existindo essa suposta ordem natural egoísta.)



*Na verdade, inicialmente a impressão que se tem é que o dilema subsistiria primeiramente entre os mais pobres, devido à condição de vulnerabilidade. Mas a recente onda de histeria entre setores da classe média brasileira, talvez demonstre que tais sentimentos podem aflorar não por ameaças objetivas, mas também por ameaças imaginárias ou perdas de privilégios banais, como ter que compartilhar aeroportos e universidades públicas com a gente "diferenciada". Mais para frente tentarei abordar esse medo.


segunda-feira, 9 de março de 2015

Voto é soberano! Pelo respeito e paz na política

O panelaço e vaias de ontem à noite (dia 08/03), somados a diversos xingamentos sexistas em pleno dia da mulher e palavras de ordem horripilantes, foram sinais de que a política atingiu o grau de ódio aberto, o que também indica que não haverá arrefecimento e sim acirramento. 

Boa parcela dessas manifestações se deu em ambientes de classe média alta, o que não quer dizer que os mais pobres estejam automaticamente com a Dilma, talvez, retrate que o nível de ódio não chegou a eles, que ainda exista um voto de confiança ou coisa do tipo, mas também não há nada que impeça que a insatisfação se esparrame pelos estratos mais pobres, ainda mais se levando em conta que a economia deve patinar nos próximos dois anos. Aos tucanos mais responsáveis, também vale lembrar que não há lá muitas garantias que serão eles a governarem na terra arrasada. Em ambientes de conflitos declarados, certas forças ganham vida própria. Nada retrata melhor isso do que a prisão de Carlos Lacerda e a frustração de suas expectativas eleitorais após o golpe militar.

Assim, é hora do governo entender que será cada vez mais acuado e deve redefinir suas bandeiras política e de aglutinação, sob pena de termos diversos reveses sociais. Bandeiras como regulação da mídia, constituinte e reforma política não possuem qualquer chance de vingar no formato que as forças de esquerda desejam. O atual Congresso é conservador e ponto final, quaisquer dessas reformas viriam para piorar, sem falar que a sociedade não está sensibilizada para essas questões. Querer então destruir mudas de eucalipto ou chamar nosso "exército" à rua é jogar gasolina no incêndio... Já as bandeiras em defesa da Petrobrás são legítimas e necessárias, mas pelo nível de ataques, vão dizer que são petistas defendendo corruptos (tratarei de uma bandeira melhor sobre a Petrobrás em outro post). 

Duas bandeiras com forças mais aglutinantes e com poder de pressão seriam taxação de grandes fortunas e/ou mais impostos para os ricos e fim do financiamento privado de campanha, mas já as considero insuficientes para o novo cenário político de acirramento. 

Assim sendo, o governo deveria adotar o lema “Voto é soberano! Pelo Respeito e Paz na política” (ou algo próximo disso). Aliás, esta não seria uma bandeira do governo e sim de todas as forças democráticas e republicanas. Existem pessoas que não gostam do governo Dilma, não gostam do PT, ou são do PSOL, mas também estão bastante preocupadas com o nível de ódio e intolerância para o qual caminhamos. Uma bandeira desse tipo coloca claramente quem defende a democracia e o respeito às escolhas de cada um. 

Não cabe aos derrotados de uma eleição ocorrida a menos de 6 meses pautarem o país e querem derrubar uma presidenta eleita. Não cabe também que cada um queira ser o intérprete do voto dos outros, definindo que os outros foram enganados, que estão arrependidos, que hoje prefeririam o Aécio ou coisa do tipo. O que vale é o resultado das urnas!!

Ademais, bandeiras políticas são estratégicas e podem redefinir rumos políticos. Na Revolução Russa o lema vitorioso foi Pão, Paz e Terra. Na Revolução Sandinista o que mobilizou o país não foram brados ao socialismo e sim à Paz. A redemocratização brasileira também não se deu por brados esquerdistas e sim pelo apego à democracia, à constituinte e ampliação de direitos. Todos querem respeito e paz, cabendo a nós colocarmos quem está em condição de defender essa bandeira, que não é defender Dilma e o PT, mas sim o resultado soberano das urnas. 

Por último, tal bandeira tem o mérito de colocar a oposição na defensiva, de mostrar quem é intolerante e não respeita as regras do jogo democrático. De mostrar que Impeachment tem caráter golpista, pois não há denúncia contra a presidenta. Sem falar que quem a julgaria seriam congressistas enrolados em casos de corrupção. Por isso, só o voto é soberano! Temos que fazer os outros entenderem que a Lei e a democracia estão do nosso lado, ou melhor, talvez, o governo e seus eleitores acuados precisam captar essa premissa básica. E quem quiser outro governo que faça uma melhor campanha em 2018.

Além disso, esse ambiente de acirramento colocam todos em pé de guerra, com sentimentos recíprocos de raiva e incompreensão. Sinalizar com bandeiras que pedem respeito e paz aglutinam indecisos e baixará a bola dos menos belicosos do lado de lá, deixando apenas os bolsonarianos e mais fanáticos a bradar pelas ruas (que infelizmente também já não serão poucos).